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    Covid pode disparar anticorpos ligados a doenças autoimunes

    Estudo revela que a infecção causada pelo vírus da covid-19 pode disparar a produção de autoanticorpos, que reconhecem proteínas do próprio organismo e estão relacionados, entre outros fatores, às doenças autoimunes. A descoberta explica por que os idosos tendem a ser mais suscetíveis à covid e o motivo de a forma grave da doença estar relacionada com distúrbios de coagulação sanguínea, como a trombose.



    SARS-CoV-2 – também conhecido como 2019-nCoV, o vírus que causa a COVID-19. Foto: NIH


    “Este achado abre caminho para entendermos uma série de eventos patológicos decorrentes da doença, que vão desde a perda de memória até a morte súbita por trombose de maior dimensão”, afirma Otávio Cabral-Marques, professor da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e coordenador do estudo.

    “A hiperinflamação característica da covid-19 grave e o aumento dos autoanticorpos geram o trombo e, por consequência, a necessidade de reconstruir tecido e de recrutar uma cascata de coagulação. Trombose e inflamação são dois eventos imunológicos intimamente ligados e o nosso estudo é mais um a confirmar essa importante relação.”

    Outro aspecto interessante do estudo, segundo Cabral-Marques, é que a elevação dos níveis de autoanticorpos, que são anticorpos que reconhecem uma ou mais proteínas da própria pessoa, podendo causar danos ao organismo, observada em pacientes com covid-19 grave, pode eventualmente valer para outras patologias.

    “Não se trata de uma exclusividade do vírus sars-cov-2, outros patógenos também podem elevar os níveis de autoanticorpos”, diz o pesquisador.

    “Isso faz com que essas moléculas se tornem marcadores ou alvos terapêuticos relevantes para salvar vidas de pacientes que estejam com sepse, por exemplo, em um estágio quase terminal”, diz o pesquisador.

    “Ao cruzar os dados por meio de técnicas de inteligência artificial, descobrimos dois autoanticorpos principais que estavam exacerbados nos pacientes com sintomas graves”, conta Dennyson Leandro Fonseca, coautor do artigo.

    “São justamente os autoanticorpos associados à formação de trombos e trombocitopenia (número reduzido de plaquetas no sangue, condição que aumenta o risco de hemorragia).”

    Fonseca explica que altos níveis desses autoanticorpos podem fazer com que o próprio organismo gere o dano tecidual a partir de trombos e de netose, que é um mecanismo imunológico que consiste na saída do material genético presente no núcleo de neutrófilos, um tipo de leucócito, em forma de redes, que são lançadas pelas células de defesa para o meio extracelular na tentativa de prender e matar patógenos.

    “Dividimos os dados entre jovens e idosos e, com isso, observamos que, embora esse mecanismo também possa acontecer entre pessoas com menos de 50 anos, ele torna o idoso mais suscetível ao agravo da doença”, diz o pesquisador. “Isso justifica o fato de a idade ser um dos principais fatores de risco para a covid-19.”

    Vale destacar que o aumento sutil de autoanticorpos faz parte do processo natural de envelhecimento. No entanto, os cientistas observaram que, diante da infecção pelo sars-cov-2, há uma exacerbação dos níveis dessas moléculas no organismo, sobretudo em pacientes graves.

    Estudos anteriores já haviam demonstrado que autoanticorpos neutralizantes de proteínas que integram a primeira linha de defesa antiviral (interferon) estavam presentes na população em geral e cresciam dramaticamente em pacientes idosos com covid-19. O estudo expande a variedade de autoanticorpos associados ao envelhecimento.

    Além disso, confirma que o impacto dos autoanticorpos varia de acordo com a idade e a gravidade da doença.

    O grupo descobriu que os pacientes com covid-19 têm um aumento significativo, e associado à idade, dos níveis de autoanticorpos contra 16 alvos, como, por exemplo, peptídeo β amiloide, β catenina, cardiolipina, claudina, nervo entérico, fibulina, receptor de insulina A e glicoproteína plaquetária.

    “Isso abre caminho para a validação dos mecanismos de ação dos autoanticorpos e amplia o conjunto de alvos, fornecendo uma imagem mais abrangente da fisiopatologia e da progressão da doença em relação ao envelhecimento avançado”, avalia Cabral-Marques. “Isso permite direcionar melhor as intervenções necessárias.”

    Já se sabe que pacientes com covid-19 grave desenvolvem danos profundos nos órgãos devido a uma combinação de várias respostas autoinflamatórias e autoimunes.

    Esse processo pode resultar em miopatia nos músculos, vasculite nos vasos sanguíneos, artrite nas articulações, síndrome antifosfolipídica associada a trombose venosa profunda, embolia pulmonar e acidente vascular cerebral (AVC), bem como lesões nos rins e no sistema neurológico.

    Além disso, a desregulação imunológica é uma característica da síndrome pós-covid, podendo causar sintomas heterogêneos, como fadiga, disfunção vascular, síndromes de dor, manifestações neurológicas e síndromes neuropsiquiátricas.

    A mais conhecida das respostas inflamatórias associadas à doença é a chamada “tempestade de citocinas”, que consiste, basicamente, na liberação aumentada de moléculas responsáveis por avisar o sistema imune sobre a necessidade de enviar mais células de defesa ao local da infecção (citocinas), desencadeando uma resposta inflamatória exacerbada e a desregulação de outros sistemas de sinalização.

    Fora a tempestade de citocinas, há também a hiperativação de macrófagos, células que promovem a produção de autoanticorpos.

    Os autores do artigo ainda não estão certos sobre o que vem primeiro: o agravo da covid-19 ou o aumento dos níveis de autoanticorpos. “Analisamos esses dois sentidos em termos estatísticos e acreditamos que os dois eventos ocorrem de forma mútua e bidirecional”, explica Fonseca. (Maria Fernanda Ziegler/Jornal da USP)

    26 DE SETEMBRO DE 2023



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